No meio de documentos que a Srª Hillary Clinton foi obrigada
a entregar à justiça norte-americana no quadro das investigações de que está a
ser alvo, por causa do desempenho como secretária de Estado de Obama, estão
papéis arrepiantes. Como este: um “memorando secreto” enviado em Março de 2002
pelo então secretário de Estado, Collin Powell, ao seu presidente, George W.
Bush, assegura que a realização de uma guerra contra o Iraque teria sempre o
apoio do primeiro-ministro britânico, ao tempo Tony Blair. “O Reino Unido
seguirá a nossa liderança”, escreveu Powell, garantindo assim a Bush que
poderia começar a preparar a guerra ao receber Blair no seu rancho de Crowford,
o que aconteceu em finais desse mesmo mês de Março.
Esta informação, que corre agora tranquilamente pelas
agências noticiosas internacionais, tem o conteúdo de uma bomba, mas não é como
uma bomba que explode aos ouvidos e olhos dos cidadãos mundiais, duvida-se até
que chegue ao conhecimento da maioria deles.
O memorando de Powell revela que um ano antes de a invasão
do Iraque se ter iniciado os Estados Unidos e o Reino Unido já tinham decidido
que a fariam. Prova-se assim que as sanções contra o povo do Iraque, os arremedos
de negociações e as célebres provas sobre a existência de armas de destruição
massiva em território iraquiano – que o mesmo Powell se encarregou de fabricar
e levar à ONU – foram manobras e mistificações para servirem de pretexto a uma
decisão já tomada. A reunião das Lajes, que o governo barrosista de Portugal se
dispôs a acolher, adquire, a esta luz, contornos ainda mais vergonhosos para a
diplomacia portuguesa e europeia, porque se fez para fingir ao mundo que ia
tomar-se uma decisão já tomada. Um faz-de-conta que, daí a dias, proporcionou o
início de uma chacina de milhões de seres humanos, ainda longe de estar
concluída.
Nesse mês de Março de 2002 já as tropas da NATO se atolavam
no conflito do Afeganistão para supostamente combater os talibãs, que por sua
vez acolhiam o terrorista Bin Laden, um criminoso criado pelos serviços
secretos dos Estados Unidos e que este mesmo país identifica como responsável
pelo 11 de Setembro de 2001. Ao virar a mira contra o Iraque, os gangsters de
Washington – versão engravatada dos pistoleiros do velho Oeste para consumo do
novo Oeste – chegaram a acusar Saddam Hussein de ser cúmplice de Bin Laden e
respectiva Al-Qaida, quando os dois eram inimigos fidagais, como não demorou
muito a provar-se. Mal os Estados Unidos e os seus mais sonantes aliados da
NATO tomaram Bagdade e enforcaram Saddam, o território iraquiano tornou-se base
de uma miríade de grupos terroristas na qual não apenas medraram muitas
variantes da Al-Qaida como nasceu o famigerado Estado Islâmico.
Documentos como este “memorando secreto” de Collin Powell
ajudam a perceber como se promovem as guerras de hoje. Para lançar as da Líbia
e da Síria nem terá sido necessário um qualquer escrito de um qualquer
secretário de Estado: a porta da mentira estava escancarada.
O Médio Oriente, que já era um barril de pólvora nesse mês
de Março de 2002, degenerou num foco de instabilidade militar no meio do qual é
fácil detectar rastilhos mais do que suficientes para uma guerra global. Os
responsáveis são conhecidos e deveriam estar a contas com tribunais que punem
crimes contra a humanidade. Porém, George W. Bush e Collin Powell vivem reformas
douradas; de Barroso conhecemos o rasto, desde as malfeitorias à cabeça da
Comissão Europeia até ao Grupo de Bilderberg, areópago da conspiração imperial,
onde ganhou assento permanente.
E Blair? Treze anos depois te ter comunicado que “seguiria o
líder” na devastação do Médio Oriente é o chefe do Quarteto para o mesmo Médio
Oriente, entidade burlesca que, fiel aos interesses israelitas e aglutinando os
Estados Unidos, a União Europeia, a ONU e a Rússia, finge que a chamada
comunidade internacional continua à procura de uma solução para o conflito
israelo-palestiniano.
Não só por causa dessa burla, mas também, assiste-se à
situação cínica e revoltante de ver a bandeira da Palestina ondular nos mastros
da sede da ONU numa altura em que o povo palestiniano está cada vez mais
distante do seu Estado independente e viável.
Somos governados por gangsters e mentirosos.
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