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segunda-feira, 16 de maio de 2016

OBVIAMENTE É UM GOLPE


 
O que está a acontecer no Brasil é, obviamente, um golpe de Estado. Desta feita os militares tiveram quem fizesse por eles o trabalho sujo da usurpação dos poderes executivos e não tardará que fiquem expostas, para quem esteja disposto a lê-las, as verdadeiras motivações dos golpistas.

É um golpe, porém não é caso isolado nem original. Assistimos a um processo de reviralho na América Latina que tem como objectivo indisfarçado a aniquilação de todas as transformações sociais e estruturais que ameaçaram o sistema de rapina montado pelas oligarquias económicas e financeiras orientadas pela mais poderosa entre elas, o complexo militar e industrial governante dos Estados Unidos da América do Norte - e de boa parte do mundo.
Os governos de países latino-americanos que de alguma maneira ousaram contestar e transformar, numa perspectiva soberana, os hábitos políticos submetidos às directivas chegadas de norte vão caindo como um castelo de cartas. Recordemos o golpe sangrento e à moda antiga praticado nas Honduras, sob comando clandestino da senhora Clinton; a inversão da tendência eleitoral na Venezuela longamente tecida pelos agentes fascistas sob orientação da Secretaria de Estado de Washington e da CIA; a silenciosa conspiração, costurada através da asfixia financeira, que recentemente triunfou em eleições na Argentina; e agora o caso do Brasil, por sinal replicado do que há quatro anos pôs termo, no Paraguai, à administração democrática do presidente Fernando Lugo. Muitos já não se recordarão, nestes tempos de memórias curtas e lavagens cerebrais ensaboadas pelas centrais multinacionais de propaganda, as mesmas que são instrumentos indispensáveis dos golpes – o caso da Rede Globo no Brasil é paradigmático mas não o único – de como se deu a “correcção de rumo” no Paraguai. Em Junho de 2012, o Congresso de Assunción, onde residem as principais famílias oligárquicas e corruptas, herdeiras dos privilégios fundiários e financeiros da sinistra ditadura de Stroessner, derrubou o presidente Fernando Lugo num processo de “impeachment,” em nome do combate à corrupção, e serviram-se do vice-presidente Federico Franco para o substituir.
A semelhança com o que está a passar-se no Brasil não é simples coincidência, sabendo qualquer cidadão medianamente informado que, tal como no Congresso de Assunción, é no Senado de Brasília que assentam os principais beneficiários da enorme irmandade da corrupção. Se o golpe no Paraguai teve a bênção de Obama, como veio a provar-se, a semelhança metodológica seguida no Brasil, em que a teia corrupta se apossa das rédeas do poder em nome do combate à corrupção, é um caso típico de gato escondido com o rabo de fora. O que é absolutamente caricato, e exemplar quanto ao cariz estupidificante da mensagem que sustenta o golpe no Brasil, é a caracterização dos golpistas como justiceiros com as mãos limpas, supostos anjos de um exército de pureza para liquidar a corrupção no país, pelos vistos nascida nas gestões de Lula e Dilma. A memória social pode ter sido encurtada, a brutificação fruto da propaganda ganha terreno, mas há realidades que estão acima de tudo isso, e a corrupção como fenómeno endémico no Brasil é uma delas.
Agora há que aguardar novos episódios desta saga vingativa, tutelada militarmente pela ressuscitada quarta esquadra norte-americana, a que patrulha a América Latina. Equador, Bolívia e Uruguai que se cuidem.
Nestes países, a conspiração golpista está em actividade permanente; ficou conhecida, por exemplo, a tentativa de secessão na Bolívia montada pelo diplomata norte-americano autor da estratégia de criação do Kosovo, e depois colocado por Obama em La Paz, por certo para tirar proveito do seu know-how. O processo não vingou, mas agora a correlação de forças regional alterou-se radicalmente.
Uma nota comum a todos estes golpes, para que conste. As manobras políticas, diplomáticas, e também militares, que têm sido aplicadas na América Latina derrubam governos democráticos livremente eleitos por sufrágio directo e universal. Tal como no Chile de Allende, em 1973. É escusado invocar o primado da democracia como motivação. Com ou sem farda, são golpes de Estado contra a democracia.

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