JISR ASH-SHUGHUR
O título deste apontamento corresponde
ao nome de uma pequena cidade do extremo nordeste da Síria, a cerca de oito
quilómetros da fronteira com a Turquia – perceberão que este pormenor não tem a
ver com qualquer sintoma de obsessão geográfica – que no dia 25 de Abril caiu
nas mãos de bandos de uma coligação de mercenários formada pela Frente Al-Nusra
(um alter-ego da Al Qaida actuando na Síria), pelo grupo Ahrar al Sham
(sustentado pelo Qatar, com ligações à Al Qaida e ao Estado Islâmico) e por
grupúsculos ditos “moderados” que giram na órbita dos anteriormente citados e
cujo apoio é publicamente assumido pelos Estados Unidos da América e dóceis
seguidores da União Europeia.
A queda de Jisr Ash-Shugur parece
corresponder ao desenvolvimento de uma nova ofensiva manipulada por Washington,
Riade, Ancara e Bruxelas (leia-se à uma NATO e União Europeia) para derrubar o
regime de Damasco, desígnio falhado ao cabo de quarto anos e centenas de
milhares de mortos. O que parece ter inclinado o balanço de forças a favor dos
mercenários islamitas foi, desta feita, a utilização de mísseis anti-tanque TOW
(opticamente teleguiados) que abalaram a habitual superioridade do exército
sírio em blindados e outros outros veículos pesados de combate. Esta
interpretação dos factos da batalha pode ler-se nas páginas do Wall Street
Journal, citando fontes terroristas, certificando assim a cooperação mutuamente
vantajosa entre a alta finança e os quadros do terrorismo islamita.
Pois bem, os mísseis TOW desequilibraram
a balança a favor do terrorismo neste ressuscitar da guerra de agressão à
Síria. Como entraram em combate? Não é muito difícil de adivinhar. A fronteira
da Turquia é mesmo ao lado de Jisr Ash-Shugur e, por muito que o governo fundamentalista
e da NATO instalado em Ancara proclame o contrário, os terroristas servem-se do
seu território como da própria casa.
Os mísseis TOW não andam por aí aos
pontapés nas redes de contrabando internacional de armas, nem estão em saldo.
Então quem os comprou e ofereceu aos bandidos islâmicos? Adivinharam se
responderam Arábia Saudita. Adquiriu-os oficialmente na fonte, a Raytheon Corp –
um dos maiores gigantes da indústria norte-americana da morte – em finais de
2013: um modesto lote de 15 mil por uma quantia módica que excedeu mil milhões
de euros. Nos pitorescos dizeres da imprensa norte-americana da altura, a Raytheon
“franziu o sobrolho” por saber que a Arábia Saudita não precisa de TOW’s desde
os tempos do falecido Saddam Hussein, mas business as usual, o negócio fez-se.
Ooops! Mas então as leis
norte-americanas – as leis, sempre essas malvadas das leis – não impedem a
revenda ou oferenda de armas a terceiros? Impedir, impedem, mas há sempre a lei
suprema, a do pragmatisno e do interesse nacional, como perceberemos se dermos
a palavra ao Washington Post. Segundo fontes da administraçao Obama que se confessaram
ao jornal que já derrubou presidentes – o que aconteceu noutra encarnação, por
certo – o senhor presidente está mesmo preocupado com o facto de tais armas
terem caído em mãos da Al Qaida porque a política de Washington, recordou, é
apenas a de apoiar “moderados”. O problema é que os “moderados”, apesar do
apoio do império, são fracos e caem sob influência dos radicais. Essa é,
afinal, a realidade que se impõe nos campos de batalha e perante a qual Washington
nada pode fazer apesar de os comuns dos mortais estarem convencidos de que
Washington tudo pode. Ou seja, Washington sabe que armas de últimas gerações
produzidas exclusivamente nos Estados Unidos seguem para as mãos da Al Qaeda e
do Estado Islâmico, contra a vontade do senhor presidente, é claro, um
conhecido cumpridor das leis internacionais.
E que faz o senhor presidente perante
tal abuso de confiança? A fonte do Washington Post explica: não se cansa de chamar
a atenção para o assunto nas conversas que tem com os seus aliados da Arábia
Saudita, da Turquia, do Qatar, etc., etc.
Ficamos todos descansados. Os
terroristas irão devolver as armas que por engano lhes chegaram. Portanto o que
aconteceu em Jisr Ash-Shugur foi igualmente um equívoco e não irá repetir-se…
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