O meu querido amigo Assírio Bacelar convidou-me a
reflectir um pouco para a chancela “Nova Vega” sobre o estado universal dos
direitos humanos, já que tanto deles se fala, fazendo parte do menu obrigatório
dos discursos dos dirigentes mundiais. Uma reflexão com olhos postos no futuro,
pelo que me pareceu óbvio tomar como base uma enumeração dos direitos humanos
reconhecidos universalmente como tal, observar o que em torno deles se passa na
actualidade e, a partir daí, de acordo com as relações de força dominantes no
mundo, tentar antever a sua evolução. Nada de feitiçaria ou adivinhação mas
apenas, e tão só, um assentamento de pistas para reflexão com base em dados
sobre de onde se partiu e onde estamos. Exercício aterrador, acreditem
Comecei por ir à fonte natural, a Declaração Universal
dos Direitos Humanos de 1948, o primeiro documento do género estabelecido à
escala planetária, onde foram apostas as assinaturas dos países então
existentes e cuja aceitação passou a ser uma condição para que cada novo Estado
independente seja admitido nas Nações Unidas. Uma leitura elucidativa: como se
o tempo estivesse à espera de poder mover-se, preso num magma de ideias e
conceitos que os mais relevantes dirigentes mundiais aceitam e dizem aplicar,
embora muitos deles se recusam a passa-los à prática, considerando-se a si
mesmos os mais respeitadores dessas normas. Capazes até de fazer guerras e
matar seres humanos em nome dos direitos humanos.
Sabem que o direito à vida é um direito humano, talvez
o mais sagrado de todos eles? Que o direito à saúde universal e à educação,
gratuita pelo menos nos primeiros quatro anos de escolaridade, são direitos
humanos? Que o direito ao trabalho, à segurança social, a uma habitação
decente, a um salário razoável capaz de garantir a subsistência digna das
famílias são direitos humanos? Que a liberdade de expressão, mas também a de
informar e ser informado e o acesso à cultura são direitos humanos? Que a comunicação
quotidiana na língua materna, o acesso a uma pátria, a igualdade absoluta de
direitos independentemente do género, opção sexual, raça, religião (ou não),
etnia, lugar de nascimento e bens pessoais são direitos humanos? Que a
preservação da privacidade pessoal e familiar são direitos humanos? São
direitos humanos reconhecidos há quase 70 anos e que, na sua maioria e em
muitos lugares do mundo, nunca saíram do papel. Sendo que, em circunstâncias
que infelizmente não são raras, alguns que ganharam vida logo começaram a
sofrer ataques para baterem em retirada.
Pois é, estes e outros direitos fundamentais têm as
raízes na necessidade de garantir a dignidade de Ser Humano. No entanto,
olhando em volta o que vemos? Todos os direitos humanos elencados na Declaração
se tornaram subsidiários de um único, também aí citado: o direito à
propriedade. Continuando ainda a olhar em volta, observando o drama que atinge
os pequenos e médios empresários, os milhões de “empreendedores” que lutam pelo
sustento em todo o mundo, o que vemos? Que todos os direitos humanos, incluindo
os destes últimos, se vergam ao direito de uns quantos à grande propriedade.
Fazem-se guerras para impor que assim seja, matam-se milhões de pessoas para
que a especulação seja livre, condenam-se centenas de milhões de seres humanos
à fome eterna, ao analfabetismo e a todas as velhas e novas doenças para que o
mercado seja soberano, enfim livre.
No estado actual, os direitos humanos emanentes do Ser
devem, pois, obediência aos direitos emanentes do Ter. E quando o Ser se
submete ao Ter, o Ser Humano torna-se um actor secundário – um servidor -
perante a arbitrariedade do lucro.
Os mais influentes dirigentes mundiais evocam e invocam
os direitos humanos a todo o momento enquanto os desrespeitam; recorrem também
a um descomunal e censório aparelho de propaganda capaz de encobrir e manipular
actos que representam uma devastação dos direitos humanos fundamentais cometida,
de facto, em favor do mais hipócrita de todos eles, o direito à especulação e à
exploração.
Destas ideias nasceu um pequeno livro: O Futuro dos
Direitos Humanos. Escrevi-o com o intuito de abrir pistas de reflexão e já está
nas livrarias. Porém, se ficaram interessados/as convém pedi-lo expressamente –
lê-se depressa e tem um preço módico – porque o tema é daqueles que “não vende”
e por isso está condenado a ficar soterrado nas prateleiras e escaparates onde
impera a lei do lucro. Ignorado, afinal, como os direitos humanos. Sinais do
regime.
Encomendas:
Encomendas:
Sem comentários:
Enviar um comentário