Acreditem que não exagero. No Quartel-General da NATO,
em Bruxelas, o ambiente é de cortar à faca. Os políticos queixam-se dos militares
e os generais estão com vontade de engolir vivos alguns políticos, com gravata
e tudo, sendo Obama e John Kerry os primeiros da fila.
Lá para as bandas de Moscovo, caso saiba deste estado
de espírito, e podem crer que sabe, quem dá gargalhadas sonoras é Vladimir
Putin. A seriedade e o respeito histórico com que assinalou o 70º aniversário
da rendição da Alemanha nazi devolveram-lhe trunfos internacionais com uma
rapidez que talvez o surpreenda: a mesquinhez, a mistificação da realidade
histórica e o culto da própria insanidade que guiaram os dirigentes
norte-americanos e da Europa Ocidental nestes dias funcionaram como tiros nos
pés de tal maneira eficazes que Putin e os que com ele estiveram a assinalar o
Dia da Vitória nada mais tiveram que fazer do que ser fiéis ao espírito da
data.
No Quartel-General da NATO, em Bruxelas, generais e
muitos diplomatas não se conformam com as “reviravoltas” de Obama. “Obrigou-nos
a fazer de conta que a Europa Ocidental teria derrotado Hitler mesmo que o
Exército Vermelho não tivesse dado cabo da Wermacht, sabendo nós que isso é uma
impossibilidade e uma falsificação da História, e logo a seguir manda Kerry
pedir a Putin que colabore o mais depressa possível numa solução pacífica para
a Ucrânia, como se não tivéssemos andado nos últimos 14 meses a alimentar grupelhos
nazis na Ucrânia servindo de iscos para colocarmos a NATO em peso nas
fronteiras da Rússia”, afirma um general, off the record, como compreenderão e
num vernáculo que aqui se atenua um pouco. “Isto não é política, isto não é uma
estratégia, é uma deriva”.
O que mudou nesse Dia da Vitória e que fez Obama
mandar o seu secretário de Estado mendigar a Putin que o recebesse? Entre os
generais que se cruzam em Bruxelas correm comentários pouco abonatórios para
com o presidente dos Estados Unidos, à mistura com dichotes que soam a piadas
de caserna.
“Obama acobardou-se com o desfile na Praça Vermelha”,
garante o mesmo general. “E não é apenas porque ao lado de Putin esteve o
presidente chinês enquanto à frente deles desfilavam armas que são para levar
muito a sério”, acrescenta. “O facto de aquele desfile ter demonstrado a
possibilidade de se juntarem militarmente os países mais extensos e populosos
do mundo como são a China, a Índia e a Rússia assustou Obama”, disse o general,
“fê-lo sentir a urgência de apostar tudo na sua estratégia de pivot asiático”.
Para isso é preciso dar parcialmente o dito por não
dito na Ucrânia, envolvendo Putin na estabilização do país – isto é, passando a
parceiro ocasional em vez de adversário a abater; e de tirar o mais depressa
possível o proveito desejado do acordo com o Irão, a entrar em vigor em 30 de
Junho, de modo a que grande parte do esforço militar norte-americano no Médio
Oriente seja transposto para o Extremo Oriente.
O que provoca o mal-estar nas cúpulas da NATO não é
tanto a correcção de rota que Obama e o Pentágono tentam fazer, mas sim a
confirmação da advertência que muitos militares europeus fizeram em tempo útil de
que o golpe e as medidas tomadas na Ucrânia estavam erradas de uma ponta à
outra. Sendo que agora é muito mais difícil corrigir o erro, mesmo que haja
vontade disso – o que não está ainda absolutamente garantido. “Soltaram-se os cães
selvagens quando teria sido muito mais ajuizado não os ressuscitar”, diz-se em
pleno Quartel-General da NATO.
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