Parece que
Portugal já tem governo. Ou melhor, a lista governativa apresentada pelo
primeiro-ministro “indicado” e não “indigitado” – é complexa e retorcida a
semântica de Belém – está a ser filtrada pelo senhor Presidente da República em
exercício, acção legítima, quiçá, mas jamais divulgada aos cidadãos nestes termos
acintosos, dir-se-iam ressabiados. Talvez o senhor Chefe do Estado queira
inteirar-se da eventualidade de estar por ali escondida alguma ameaça
terrorista, algum “feroz” inimigo da NATO, um sinistro contestatário do euro e
da liderança absoluta dos mercados. Espécie de portugueses bastardos, ao que
consta.
Nesta
manobra se vão perdendo mais uns dias, já lá vão 52 desde as eleições gerais e
mais de duas semanas desde os acordos que selaram a existência de uma maioria
parlamentar que permite a formação de um governo legítimo, estável e coerente –
tudo o que não é garantido pelo executivo demitido mas que tarda em largar o
poder.
Cinquenta e
dois longos dias em que o senhor Presidente gerou uma cacofonia de conceitos
sobre a suposta maldição que assaltou o país através de entendimentos políticos
entre partidos que desmantelaram a ilegitimidade do chamado “arco da governação”,
espécie de travesti de partido único talhado à medida de financeiros e agiotas
globais. Entre figuras e figurões que integraram a romaria dos que o foram
aconselhar, de tal competência que muitos deles, há um ano apenas, juravam que
a solidez do BES era de betão – o senhor Presidente foi ainda escutar as
cagarras madeirenses para finalmente se render à evidência – sem se dar por
convencido - de que a melhor prática democrática e republicana é entregar a
formação dos governos às maiorias parlamentares.
Antes ainda
de se retirar para fiscalizar a lista ministerial que lhe foi entregue por
António Costa, o Chefe do Estado Português apresentara exigências, digamos,
insólitas para quem tinha a obrigação de conhecer de cor e salteado os acordos
de incidência governamental da maioria e também o programa de governo do
Partido Socialista deles resultantes. O senhor Presidente apresentou meia dúzia
de condições com duas interessantes particularidades: nenhuma delas revelava
preocupação com as pessoas, mas sim com os falcões da NATO, os suseranos de
Bruxelas, os magarefes das finanças, além de proclamar o absolutismo de
tratados que hipotecam a soberania nacional; e quando olhadas uma por uma,
nenhuma dessas condições poderia ser cumprida pelo governo ainda em funções,
muito menos as de governabilidade, durabilidade e estabilidade, porque não
dispõe este executivo de maioria parlamentar, isto é, de base para governar.
Tirar uma tal conclusão nada tem de abusivo e especulativo: o senhor Presidente
não impôs as mesmas condições ao primeiro governo que empossou, o qual em
poucos dias ruiu fragorosamente, vítima da aritmética simples do funcionamento
parlamentar. Assim sendo, o conceito presidencial de estabilidade e de
durabilidade para quatro anos digamos que é flexível.
Dir-se-ia,
através do arrastamento destes processos, que o senhor Chefe do Estado não se
importou de deixar o país refém dos seus humores de mau perdedor, do feitio de
vingativo que lhe veio ao de cima, por exemplo, no discurso de reeleição. Houve
mesmo agentes económicos e até membros da academia de novos feiticeiros
conhecidos como “politólogos” que desaconselharam tal comportamento, por ser
susceptível de irritar os mercados levando-os a castigar o país – isto é, não o
senhor Presidente mas as pessoas, os cidadãos comuns - e a dificultar
desnecessariamente a vida ao próximo governo.
E, contudo,
Portugal sobreviveu. Os sapientes “analistas” financeiros, outra casta de
bruxos em funções, surpreendem-se até que o mais recente leilão de dívida
pública portuguesa a dez anos tenha decorrido com juros contidos – dir-se-ia
até, pelo tom dos comentários, que desejariam o contrário para não terem de
engolir as previsões catastrofistas.
Portugal
sobreviveu, mas em cacos, e 52 dias assim desbaratados não lhe dão saúde, muito
menos ao coração do país, as pessoas. Agora há que limpar e arrumar a casa e
tentar ir o mais longe possível na sua restauração ao serviço dos cidadãos.
Infelizmente a varredela do Palácio de Belém ainda tem de esperar até Março.
52 dias de um flop total, Cavaco, no seu melhor, deixou o Pais em suspenso quase 2 meses. Ora, era precisamente para evitar isso, que foi eleito(não por mim, felizmente). Cavaco Silva actuou sempre como putativo Presidente do PPD/PSD ou lá o que aquilo é e não como um PR.O Actual PSD/PPD. É um saco de cães raivosos, pendurados no próprio umbigo
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