Quarenta anos depois de terem sido escorraçadas do solo
vietnamita, levando consigo um escabroso Nobel da Paz atribuído a um fabricante
de ditadores chamado Henry Kissinger, as tropas imperiais continuam a matar. Os
sinais da agressão terrorista dos Estados Unidos da América contra o povo do
Vietname, cometida no âmbito da cruzada permanente supostamente para expurgar o
comunismo da face da Terra, ainda estão vivos – não apenas na memória dos que a
sofreram, mas na carne e no sangue de milhares e milhares de pessoas que nascem
hoje, muito depois do auge da tragédia.
Tal como aconteceu em Hiroxima e Nagasaki, a arrogância, a
insensibilidade e a desumanidade dos exércitos imperialistas deixaram mecanismos
de morte com efeitos contínuos, de origem atómica nos casos do Japão e de acção
química no caso do Vietname. Neste país, onde o exército norte-americano abriu
vias para as suas ofensivas à força de napalm, cujas nuvens de chamas cremaram
todas as formas de vida por décadas e décadas em extensas áreas territoriais,
milhares de crianças continuam a nascer com malformações, problemas
neurológicos e cancerígenos devido aos efeitos da dioxina decorrentes de um
outro exercício de extermínio: neste caso, o cometido com recurso ao chamado
agente laranja – aliás um herbicida que multinacionais continuam a
comercializar alegando, e mentindo, que está livre de agentes nocivos para a
vida humana.
De acordo com dados norte-americanos, as tropas enviadas por
Washington para o Vietname lançaram 80 milhões de litros de agente laranja
contaminados com 400 quilos de dioxina só em cinco anos da invasão, que se
prolongou por 14 anos. Usado para destruir florestas e todo o tipo de vida que
elas protegem, o agente laranja causou danos irreparáveis que funcionam ainda
hoje como uma catástrofe em todo o Vietname e, acima de tudo, liquidou, afectou
e continua a atingir milhões de vidas humanas através dos seus efeitos
prolongados. Fontes de Washington pretendem explicar, de modo recorrente, que o
uso do agente laranja não se destinava a atingir vidas humanas, mas sim a
desfolhar florestas onde se acoitavam “os terroristas”. A coisa só correu mal,
dizem, porque devido às pressões da guerra foi preciso recorrer a agente
laranja de “purificação imperfeita”, pelo que a contaminação com dioxina
provocou – onde é que já ouvimos isto? – “danos humanos colaterais”.
As vítimas vietnamitas do agente laranja formaram uma
associação através da qual pretendem que o mundo conheça esta realidade tão
escondida pelos canais da propaganda mundial, exigindo ainda que os autores da
chacina e seus herdeiros políticos e militares assumam a responsabilidade por
esses crimes de guerra e contra humanidade – com os quais nenhum tribunal
internacional, em Haia ou qualquer outro lugar, parece disponível para se
sobressaltar. Até agora, como é de esperar da mentalidade que governa a América
e o mundo, não há responsabilidades a assumir. Se o napalm e o agente laranja
continuam a matar quarenta anos depois, o azar é das vítimas.
Ironia do destino: em tempos, uma associação de veteranos de
guerra dos Estados Unidos levantou uma acção legal em defesa de soldados que
participaram na invasão do Vietname e foram também contaminados pela dioxina.
Um acordo que previa indemnizações de 93 milhões de dólares foi invalidado em
último recurso por uma sentença determinando que “não existe qualquer base
legal” que sustente as alegações das vítimas, tanto em termos domésticos como
nas leis internacionais.
As acções de extermínio cometidas pelas tropas imperiais
contra o povo do Vietname, com a agravante de continuarem através de efeitos
retardados, estão ao nível dos maiores crimes contra a humanidade que a
História regista. Ao contrário dos conceitos defendidos pelo Nobel da Paz e
criminoso de guerra Henry Kissinger, separando ditadores bons dos maus, também
não existe terrorismo bom ou mau: há terrorismo. De que a invasão
norte-americana do Vietname foi e continua a ser um exemplo.
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