Trinity, Little
Boy, Fat Man… Ou Trindade, Rapazinho, Homem Gordo, três designações
inócuas e inocentes para um dos maiores crimes contra a humanidade, por certo o
maior crime de guerra que continua impune.
Três nomes inócuos e inocentes para três bombas nucleares
paridas pelo chamado Projecto Manhattan, em segredo máximo e através de
financiamentos clandestinos inspirados em práticas mafiosas de lavagem de
dinheiro. Dois mil milhões de dólares foi quanto custou a produção dos três
primeiros protótipos de bombas atómicas construídas pelos Estados Unidos, duas
das quais foram testadas, por exigência do presidente Truman, nas cidades
japonesas de Hiroxima e Nakasaki, tragédias sobre as quais se completam agora 70
anos de luto universal.
A Alemanha nazi rendera-se; a Itália fascista também; o
Japão nacionalista estava de rastos, negociando nos bastidores, com as
potências vencedoras, a sua rendição. De acordo com versões coincidentes de
numerosos historiadores, Tóquio pretendia somente salvaguardar a figura do
imperador, circunstância com significado interno mas sem qualquer repercussão
externa ou de índole militar.
O uso da bomba de urânio sobre Hiroxima, em 6 de Agosto de
1945, e da bomba de plutónio sobre Nakasaki, em 9 de Agosto, não era necessário
para ganhar uma guerra cujo desfecho estava decidido. O sacrifício de centenas
de milhares de japoneses inocentes foi o investimento feito pelo complexo
militar-industrial norte-americano para mostrar quem ganhara efectivamente a
Segunda Guerra Mundial e, sobretudo, quem iria ganhar as guerras seguintes,
isto é, quem iria reinar imperialmente sobre o mundo. Essas eram então as
circunstâncias.
Por razões estratégicas que se relacionam com os grandes
avanços das investigações científicas nos processos da cisão nuclear e das
reacções em cadeia, a corrida à bomba atómica mobilizou a Alemanha e os aliados
nos últimos anos da guerra. Os Estados Unidos, que entraram tardiamente na
guerra, estavam na frente graças aos trabalhos de cientistas de várias
nacionalidades, entre os quais se destacou Julius Oppenheimer, de ascendência
alemã, a quem Roosevelt entregou a chefia do Projecto Manhattan, nome de código
para a produção da bomba atómica em instalações secretas construídas em Los
Alamos, no Novo México. Los Alamos não existia, a não ser como uma
posta-restante: “1663 Santa Fe”.
Do projecto resultaram três protótipos. Um deles, Trinity,
foi testado em segredo no deserto, perto de Alamogordo, em 16 de Julho de 1945.
A guerra na Europa terminara havia dois meses e caminhava para o fim na Ásia.
Pode afirmar-se, sem erro, que apesar dos avanços científicos a bomba atómica
chegou atrasada à Guerra Mundial. Truman sucedera a Roosevelt por morte deste e
a sua administração desdobrou-se em pretextos para testar os dois outros
protótipos ainda em cenário real, como sinal de superioridade global.
Oppenheimer calculara que o lançamento de uma bomba atómica sobre uma cidade
poderia provocar cerca de 20 mil mortos. Vaticínios conservadores, dir-se-ia
hoje. Em Hiroxima, sob o impacto de Little Boy, morreram mais de cem mil
pessoas nos dois primeiros dias e ainda há seres humanos que morrem hoje devido
ao efeito continuado das radiações, incluindo pessoas que herdaram de pais e
avós as degenerações genéticas por elas provocadas. Em Nakasaki, sob o impacto
de Fat Man, perderam a vida entre 60 mil a 80 mil pessoas nos primeiros dias. A
primeira foi lançada em 6 de Agosto: deveria ter sido em 1 de Agosto, mas um
tufão alterou os planos; a segunda abateu-se sobre Nagasaki, mas deveria ter
sido sobre Kokura: tal não aconteceu devido ao facto de esta cidade se
encontrar sob céu nublado. Pelo carácter fortuito das decisões percebe-se que
não foram tomadas em função de necessidades objectivas de guerra, mas sim pelo
desejo arrogante de intimidar tanto inimigos como aliados.
Os segredos de Los Alamos não tardaram a tornar-se de
Polichinelo. Hoje há 17 mil ogivas nucleares no mundo, segundo organizações de
físicos norte-americanos, desconhecendo-se se esse número inclui ou não as de
países, como Israel, que escondem as suas capacidades. Todas elas multiplicam
exponencialmente o potencial de morte das três estreantes. O sacrifício das
populações de Hiroxima e Nagasaki foi em vão. Um conflito nuclear na actualidade
não deixará ninguém em condições de registar quem o ganhou, porque não terá
vencedores.
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