Um estudo de uma entidade alemã, o Instituto de Investigação
Económica de Leibniz, reconhece que a crise da dívida soberana grega
proporcionou vantagens de pelo menos 100 mil milhões de euros à República
Federal da Alemanha. De acordo com os autores da investigação, estes lucros
faustosos resultam de um mecanismo simples: as más notícias sobre a situação
financeira grega minimizam as taxas de juro das obrigações alemãs nos mercados
e as boas notícias sobre a situação grega (onde estão?) fariam subir os juros
das obrigações germânicas. Em termos corriqueiros, o sofrimento dos gregos
permite à Alemanha financiar-se a preços de saldo.
As revelações deste estudo, cujo conteúdo coincide com os de
outros trabalhos do género divulgados igualmente na Alemanha, representam a
ínfima parte que se vai conhecendo de uma realidade clandestina e criminosa que
é o assalto dos mercados financeiros internacionais, através do FMI e de
instituições da União Europeia, contra o povo grego e os povos mais
desprotegidos pelos seus governos – como é também o caso de Portugal.
Um assalto consumado sob o pretexto do combate às dívidas
soberanas e que, através de acordos impostos pelos credores com normas e anexos
clandestinos, serve para financiar bancos e outras instituições financeiras
privadas graças à venda dos activos públicos e aos sacrifícios impostos às
populações dos países “ajudados” – expressão cujo cinismo é próprio do léxico
dos mais refinados ladrões.
Elementos sobre a dívida soberana grega apurados no âmbito
da auditoria cidadã realizada para esclarecer os dados mais importantes da
crise revelam que a dívida pública helénica em 2010 era de 200 mil milhões em
títulos e subiu para 227 mil milhões até 2014, na sequência da intervenção da
troika (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e FMI).
Pelo caminho, e correspondendo a anexos clandestinos apensos
aos acordos desenhados e impostos pela própria troika, a dívida foi transferida
para credores de âmbito bilateral – 14 países europeus e o banco público alemão
KfW – um processo segundo o qual grande parte do dinheiro supostamente emprestado
à Grécia nem sequer chegou ao país e seguiu directamente para bancos e outras
instituições financeiras privadas. Para tal activaram-se mecanismos e
manigâncias tendo como base uma conta aberta para o efeito no Banco Central
Europeu. Verifica-se, deste modo, que as receitas originadas pela aceleração
das privatizações e os produtos da cruel austeridade serviram para financiar
estabelecimentos financeiros privados e delapidar os bens públicos.
O Estado alemão não integra o grupo dos credores; a parte
germânica no processo é garantida pelo KfW, um banco público alemão criado
ironicamente no quadro do Plano Marshall que permitiu o relançamento económico
da Alemanha no pós-guerra e que tem como presidente uma pessoa que dispensa
apresentações: Wolfgang Schauble, o ministro das Finanças do governo de Merkel,
um conhecido serviçal dos mercados financeiros e correspondente processo de
nazismo económico, um inimigo jurado dos gregos e outros povos europeus.
Não se choquem com a expressão “nazismo económico”. Como se
sabe, as dívidas soberanas dos menos poderosos e desprotegidos países da União
Europeia, aumentadas e transformadas através das criminosas políticas de
austeridade, são a matéria de que vive o chamado Fundo Europeu de Estabilidade
Financeira (FEEF), que não passa de uma instituição financeira privada e
especuladora com sede no Luxemburgo, criada em 2010 pela União Europeia, a
pretexto da crise, para sustentar o euro e, supostamente, ajudar a combater as dívidas
soberanas – aumentando-as.
O FEEF é o coração de um processo que gere os empréstimos
aos países em dificuldades de maneira a que as “ajudas” sigam para as
instituições financeiras privadas e os activos tóxicos onerem as dívidas
públicas, no caso grego através de um fundo helénico, também privado, e
transitando via Banco Central.
Como se disse, o FEEF é um fundo privado, com títulos
cotáveis em bolsas, mas tem como suporte operacional a Agência Alemã de
Administração de Dívida, entidade sob controlo público ao serviço de
investidores privados e supervisão do Ministério das Finanças, via pela qual é
possível reencontrar a tutela do omnipresente Schauble.
Os círculos fecham-se e mostram de onde vem a voz do dono
disto tudo. As auditorias independentes que se vão fazendo provam a falácia do
argumento segundo o qual os contribuintes alemães sustentam os vícios e
desmandos dos madraços dos sulistas; o esquema das dívidas soberanas está
montado segundo modelos especulativos em benefício de interesses privados com a
cumplicidade de agentes públicos ao serviço dos privados, incluindo na Alemanha.
Tais mecanismos são alavancas de um sistema de germanização
da Europa, que dos tempos de Hitler tem objectivos semelhantes, porém a
alcançar por via financeira e económica. Por detrás do monstruoso aparelho
militar do Reich estavam os expoentes da economia e dos mercados financeiros;
por detrás do nazismo económico actual estão as novas gerações dos expoentes da
economia e dos mercados financeiros.
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