Poucos instrumentos ditos de “assistência financeira”
existirão cujas letras e espírito revelem de modo tão flagrante a mentalidade
ditatorial, de secretismo e de protecção à grande especulação financeira
reinantes na União Europeia como o chamado Mecanismo de Europeu de Estabilidade
(MEE). Mentalidade essa extensiva ao chamado arco da governação, que em
Portugal o ratificou apressadamente e à sorrelfa mesmo antes de a Alemanha o
fazer, esquivando-se a todo e qualquer debate público.
A esmagadora maioria dos cidadãos da União Europeia ignora a
envergadura e a influência desta monstruosidade antidemocrática de que se vai
falando a propósito da chamada “ajuda” à Grécia, e que transformará este país
num pobre protectorado da Alemanha se não sair rapidamente do euro. Destino
esse que está traçado para todos os outros membros da União Europeia com
dimensões económicas equivalentes, ou mesmo superiores.
A propósito dessa aberração é importante que se saiba desde
logo o seguinte: nos termos do próprio tratado que o criou, em Fevereiro de
2012, o MEE não existe para ajudar países em dificuldades, muito menos os seus
povos. A “missão” do MEE é prestar “assistência financeira” a países da moeda
única “afectados ou ameaçados por graves problemas de financiamento, se tal for
indispensável para salvaguardar a estabilidade financeira da área euro no seu
todo e dos seus Estados Membros”.
Isto é, o Mecanismo Europeu de Estabilidade existe para
garantir a existência do euro tal como foi criado e existe, ou seja o marco
alemão institucionalizado como moeda oficial em 19 países.
Cabe a este mecanismo, em coordenação com a Comissão
Europeia, o Banco Central Europeu e o FMI – a troika pura e dura – definir as
condições em que será prestada “assistência financeira”, depois de, entre
outras coisas, avaliar a sustentabilidade da dívida soberana de quem a solicitar.
O objectivo confessado do MEE é funcionar “como defesa contra as crises de
confiança que afectem a estabilidade do euro”. Isto é, a moeda única acima de
tudo.
Como a elaboração e ratificação do MEE foram subtraídas ao
conhecimento dos cidadãos, é importante ter a noção da estrutura interna e
respectivos “privilégios e imunidades” constantes do tratado. O presidente é o
presidente da zona euro, uma estrutura que não tem existência institucional no
âmbito da União Europeia e cujo principal dirigente não é eleito por ninguém. O
Conselho de Governadores é formado pelos ministros das Finanças dos 19 Estados
da moeda única, cada um dos quais nomeia um administrador “de entre pessoas que
possuam elevada competência em matéria económica e financeira”. Sobre a
essência democrática deste processo está tudo dito.
Nos termos do tratado, o MEE, os seus bens, fundos e
activos, independentemente de onde se encontrem e quem os detenha, “gozam de
imunidade” perante “qualquer forma de processo judicial”; são “imunes de busca,
requisição, confisco ou qualquer outra forma de apreensão arresto ou oneração”;
são ainda “isentos de restrições, regulamentações, controlos e moratórias de
qualquer natureza”.
Os governadores, administradores e pessoal, mesmo os que já
não estejam em exercício, são obrigados a sigilo profissional e “gozam de
imunidade de jurisdição” em relação aos actos praticados e documentos
produzidos.
Os locais, arquivos e documentos do MEE “são invioláveis”; o
MEE, os seus activos, bens, operações e transacções “estão isentos de qualquer
imposto directo”, os bens por eles importados “estão isentos de quaisquer taxas”;
as obrigações, títulos, juros e dividendos associados ao funcionamento do MEE “não
estão sujeitos a qualquer tipo de tributação”.
O pessoal do MEE paga um imposto interno que “reverte em seu
benefício”, ficando isento dos impostos nacionais sobre rendimentos.
Uma singela nota final: a União Europeia, que nunca se orientou
verdadeiramente pelos mecanismos democráticos, desembocou na ditadura do euro,
moeda que serve apenas um dos seus membros, a Alemanha. Qualquer país da Zona
Euros que pretenda restaurar a sua soberania e viver em democracia tem de
abandonar a moeda única, não há volta a dar-lhe.
A ver vamos diz o cego
ResponderEliminarentretanto... não basta ter razão
Abraço